Vida em Movimento #01 – Terceiro setor, responsabilidade social e investimento social privado
Fundo musical.
Narrador:
Mobilidade urbana. Mobilidade social. Inclusão de pessoas com deficiência. “Vida em movimento”, o podcast da Fundação Grupo Volkswagen.
Fundo musical.
Marcelo Abud:
Este é o “Vida em movimento”, o podcast da Fundação Grupo Volkswagen. Eu sou Marcelo Abud, professor e podcaster.
Renata Pifer:
Eu sou Renata Pifer, internacionalista e parte do time da fundação. Vamos estar aqui todos mês com entrevistados que colocam ideias e boas práticas em movimento. Mobilidade urbana, mobilidade social e inclusão de pessoas com deficiência são as causas que vamos percorrer.
Marcelo Abud:
Neste primeiro episódio, nossa conversa é sobre terceiro setor. Aliás, você sabe o que é isso? E qual a diferença de responsabilidade social corporativa e investimento social privado? É sobre isso e pouco mais que vamos conversar aqui.
Renata Pifer:
Estamos recebendo no estúdio em São Paulo a diretora superintendente da Fundação Grupo Volkswagen em São Paulo e diretora de assuntos jurídicos da Volkswagen do Brasil, Daniela de Avilez Demôro. Ela é advogada, mestre em Direito e atua no terceiro setor e sustentabilidade há quase 20 anos.
Marcelo Abud:
Também está conosco o diretor de administração e relações institucionais da Fundação Grupo Volkswagen, Vitor Hugo Néia. Ele é historiador, mestre em ciências e trabalha no terceiro setor há mais de 10 anos.
Renata Pifer:
E, completando nossa mesa, contamos com o diretor executivo da Prattein Consultoria, empresa especializada no planejamento, desenvolvimento e avaliação de programas e projetos sociais, Fábio Ribas.
Marcelo Abud:
O Fábio também foi superintende do Gife, grupo de institutos, fundações e empresas, na etapa de criação dessa entidade. Muito obrigada a todos pela presença e estamos muito felizes de iniciar nossa jornada com vocês.
Renata Pifer:
Daniela, ultimamente a Fundação Grupo Volkswagen tem trazido uma série de inovações para o terceiro setor. Esse podcast é uma delas. Então, conta pra nós. O que moveu a fundação a criar o “Vida em Movimento”?
Daniela de Avilez Demôro:
São várias as razões. Primeiro, muito honrada em participar desse primeiro podcast da Fundação Grupo Volkswagen.
Nessa era digital em que a gente vive, em que tudo é muito digitalizado, nós acreditamos que existe uma perda de conectividade entre o ser humano e a narrativa. E nós queremos retomar essa conexão da criança que ouve histórias e do ser humano, na vida profissional, que continua ouvindo histórias e propagando histórias. Por isso “Vida em Movimento”. É uma narrativa histórica, não somente de conteúdo, mas para abrir um espaço social de conversa, de deixar mensagem, de escutar e de trazer o nosso ouvinte para a mesa junto conosco e um movimento que acaba sendo depois, naturalmente, perpetuado em ondas, que vem uma atrás da outra, cada vez mais profundas, para que possamos juntos melhorar a sociedade.
Marcelo Abud:
Perfeito. Fábio, eu acho que é importante antes de entrar no tema de hoje, definir o que é o terceiro setor, por favor!
Fábio Ribas:
Bom, esse é um tema essencial hoje no Brasil e no mundo, né? Porque terceiro setor são todas aquelas iniciativas de cidadãos e de organizações da sociedade civil que tem finalidades públicas, ou seja, estão voltadas a causas sociais, a objetivos de melhoria das condições de vida numa sociedade.
E o terceiro setor, como o nome já diz, na sua definição, ele se articula, de certa forma, se diferencia do primeiro e do segundo setor.
O primeiro é o estado, que no Brasil é um estado democrático de direito. O segundo são todas as iniciativas privadas, aí nós estamos falando do mundo das empresas e do mercado, cujas finalidades são privadas ainda que tudo que se espera das empresas são ações que beneficiem também a sociedade.
E o terceiro se coloca, então, como essa articulação possível entre estado e mercado. Onde cidadãos, empresas, inclusive, que criam suas fundações, seus institutos sem finalidades lucrativas, buscam criar melhores condições de vida dentro de uma sociedade.
E terceiro setor tem a ver, então, com cidadania, com o fato de que vivendo em numa sociedade a pessoa e as organizações da sociedade civil também se comprometem com a melhoria das condições de vida de toda a população.
Renata Pifer:
E agora que entendemos o que é terceiro setor, o que define uma empresa, instituto ou fundação como investidor social?
Fábio Ribas:
Embora seja uma organização do chamado segundo setor, ou seja, iniciativa privada, com fins lucrativos, as empresas também estão conscientes que de os impactos que elas podem gerar e devem gerar na sociedade, podem ser ampliados se elas criarem seus institutos, fundações ou mesmo que não tenham institutos e fundações criados, que elas se reconheçam como participantes de uma sociedade mais ampla, não é?
Que não se constitui só por um mercado de venda de produtos, de investimentos financeiros, mas uma sociedade que precisa ser equilibrada, sustentável, que tenha condições de criar condições de vida dignas e adequadas para a maioria ou para toda sua população.
Marcelo Abud:
E Vitor, eu acredito que nosso ouvinte queira saber a diferença entre responsabilidade social e investimento social privado. O que caracteriza um e outro?
Vitor Hugo Néia:
Bem, são termos que surgem no Brasil com força nos anos noventa. Não à toa, na década de 90 foram criados dois órgãos fundamentais para pensar esse setor aqui no país. Que foram o instituto Ethos e o Gife, do qual o Fábio foi um dos idealizadores e pioneiros.
Em linhas gerais, eu acredito que quando nós falamos de responsabilidade social corporativa, nós estamos olhando primeiro para empresa, ou seja, para o segundo setor e, principalmente, para a gestão empresarial.
Então é como a empresa de fato atua e pensa suas estratégias se vendo como corresponsável pelo impacto social que ela tem, não só na comunidade do entorno, mas também na sua cadeia de fornecedores, com seus funcionários e com seus clientes.
Eu costumo dizer que hoje a responsabilidade social corporativa não é uma opção, é uma obrigação e uma empresa que não é socialmente responsável, está fadada a desaparecer.
Por outro lado, o investimento social privado, que acaba sendo uma das facetas da responsabilidade social, por exemplo, quando se cria uma fundação como a Fundação Grupo Volkswagen, ele se difere primeiro porque ele é um repasse voluntário de recursos, então ele vai além da responsabilidade social, ele é um repasse sistemático, tem uma avaliação, tem uma finalidade, tem um monitoramento desse impacto.
Por isso que ele também se diferencia das doações esporádicas, daquela visão assistencialista que se tinha desses repasses, porque ele é pensado de uma forma organizada e sustentável.
E não necessariamente um investimento social privado necessita ser feito por uma empresa. Não à toa nós temos fundações, institutos empresariais e também fundações e institutos familiares ou mesmo pessoas físicas que atuam nesse setor.
Para exemplificar como se diferencia a partir do exemplo da Fundação Grupo Volkswagen, do próprio Grupo Volkswagen, esses dois conceitos, em 1979, quando a Volkswagen alemã resolveu transferir recursos para o Brasil criar uma fundação, ela estava agindo de uma forma socialmente responsável.
A partir daí, tudo o que a fundação faz, que é esse repasse voluntário de recursos privados para projeto social, educacional, ambiental, desde que o interesse seja público, a partir daí o que a fundação faz com o repasse desses recursos é investimento social privado.
Renata Pifer:
Muito esclarecedor, Vitor. Obrigada. E, Fábio, podemos dizer que tanto a valorização da responsabilidade social corporativa quanto a do investimento social privado são frutos das mobilizações que surgem com maior força no Brasil a partir da constituição de 88. O que mudou de lá para cá?
Fábio Ribas:
O grande desafio tem sido, cada vez mais, colocar na prática este conceito de responsabilidade social, cidadania. O fortalecimento da sociedade civil ainda é um desafio em aberto. Daí a importância do terceiro setor não ser só um conceito, mas realmente se tornar uma prática.
Então a constituição de 88, chamada, por sinal, de constituição cidadã, abre portas, estímulos para que a sociedade se organize mais em associações, ONGs, instituições com finalidades sociais.
Porque, senão, a gente fica numa espécie de dualidade entre mercado e Estado e, justamente, o terceiro setor vem para propor que nós tenhamos uma visão mais ampla da sociedade.
Aonde o cidadão passe a participar mais da definição das políticas públicas, compreenda melhor como tem sido utilizado os recursos públicos, quais são as principais demandas em áreas como saúde, educação, moradia, saneamento, inclusão das pessoas com deficiências nas escolas, na sociedade, mobilidade urbana, temas que são tão importantes e que são focalizados pela Fundação Grupo Volkswagen.
Daniela de Avilez Demôro:
Eu acho perfeita essa colocação. Eu também entendo o terceiro setor como sendo um grande palco social, também que precisa ser profissionalizado. Esse podcast aqui, acho que a gente tem a oportunidade de ajudar e de provocar a sociedade do terceiro setor, quer dizer, a sociedade civil como um todo e aqueles que trabalham no terceiro setor, nessa busca de profissionalização, que é muito importante esse ponto e não pode ser esquecido.
Marcelo Abud:
E pensando de maneira mais global, qual a relação entre investimento social e desenvolvimento social. Em outras palavras, os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU dialogam com o investimento social, Fábio?
Fábio Ribas:
Certamente dialogam.
O que que é desenvolvimento social sustentável? Não é só aquele que é ambientalmente equilibrado, mas é também com uma economia que viabiliza condições de inclusão produtiva, trabalho e renda para a maioria da população.
É aquele que é socialmente justo, ou seja, busca uma sociedade com menos desigualdade, com menos diferenças, como por exemplo no Brasil, tornam a sociedade extremamente dividida entre pessoas muito pobres, acumulação muito intensa de recursos em pequenas parcelas da população e, também, não é para você pensar em uma sociedade sustentável então sem ambiente equilibrado, economia viável, sociedade menos dividida, menos desigual e uma democracia funcionando.
Para que essa democracia funcione, o terceiro setor é muito importante, porque o cidadãos começam a compreender melhor a realidade, as organizações se qualificam mais, planejam melhor suas ações, definem claramente seus objetivos e buscam atuar em sintonia com, de um lado o Estado, de outro as empresas para promover melhorias na sociedade.
Daniela de Avilez Demôro:
E o equilíbrio social custa muito caro e ele gera muitas controvérsias e muitas ações judiciais, muitos problemas e discussões que custam caro porque impactam a produtividade de um país. E o terceiro setor tem, realmente, como missão ser um peregrino na busca do equilíbrio.
Fábio Ribas:
Nessa linha tão interessante que você coloca, né? Emerge aí o conceito de capital social. O terceiro setor tem muito a ver com esse conceito, que foi até proposto por um importante estudioso chamado Putnam, que escreveu um livro chamado “Como as democracias funcionam?”. E no conceito dele, para que uma democracia funcione bem, é importantíssimo que haja fortalecimento do que ele chamou de capital social. E o que é isso? É a participação do cidadão, das organizações com mais consciência, mais informação, mais desenvolvimento ativo e qualificado nas questões de caráter público, ou seja, não é mais apenas aquilo que interessa a mim nos meus interesse privados e nem deixar na mão de um certo Estado, que está longe de mim, a resolução dos problemas. Todos temos responsabilidades.
Renata Pifer:
Daniela, vamos falar um pouquinho agora sobre a origem da Fundação Grupo Volkswagen. Como ela surge e o que a sua trajetória tem a ver com tudo o que falamos até aqui?
Daniela de Avilez Demôro:
Assim como o Vitor já nos deu um pedacinho de informação, em 1979 a Volkswagen da Alemanha resolveu destinar fundos para criação de uma fundação no Brasil. Há 40 anos, um pouquinho mais de 40 anos atrás, essa definição do terceiro setor ainda muito mais embrionário do que hoje, então eu diria que o percurso da fundação, que hoje deixa de ser Fundação Volkswagen para passar a ser Fundação Grupo Volkswagen, passou também por um amadurecimento.
Eu diria que assim como o ser humano aos 40 anos começa a ter a sua plenitude de maturidade, a nossa fundação chega aos 40 anos se renovando e tendo a certeza hoje do caminho a traçar e a trilhar daqui pra frente.
Marcelo Abud:
Perfeito! Daniela, aproveitando que você citou essa mudança de Fundação Volkswagen para Fundação Grupo Volkswagen depois de 40 anos de atuação, o que, na verdade, a gente tem de novidade a partir dessa mudança? Por que agora Fundação Grupo Volkswagen?
Daniela de Avilez Demôro:
Da mesma forma que nós tivemos nos primeiros 40 anos o apoio da montadora Volkswagen e no decorrer desses 40 anos a montadora também, mundialmente falando, adquiriu outras marcas e se modernizou nesse mundo dos negócios, nós estamos acompanhando essa modernização entendendo que as outras marcas participantes do Grupo Volkswagen, mundialmente falando, tem muito a colaborar também no terceiro setor.
Então, nós resolvemos levar essa discussão adiante, para que, com o aporte financeiro das outras marcas, possamos criar um impacto cada vez maior e mais duradouro. Trazendo, justamente, essa viabilidade econômica para o terceiro setor, de profissionalização, de sustentabilidade. Enquanto fundação a gente tem que ter essa preocupação e o chamamento as outras empresas do grupo, participa também dessa missão e dessa estratégia.
Renata Pifer:
Vitor, a fundação fez uma pesquisa recentemente para identificar temas e causas relevantes para a sua gestão e atuação. Você pode comentar um pouco sobre essa metodologia e o que resultou dela?
Vitor Hugo Néia:
É sempre um prazer falar um pouco sobre como foi esse processo da fundação, até porque a metodologia em si não foi uma grande novidade, o que a gente fez foi uma matriz de materialidade, foi a utilidade que a fundação deu para essa matriz.
Então, a gente pensou, já que a gente vai abrir um canal de escuta e de consulta aos nossos stakeholders, aos nossos públicos de interesse, por que não usar esse diálogo e usar esse processo para entender aquilo que eles pensam sobre a fundação e, principalmente, para retribuir à sociedade civil?
Nós abrimos uma consulta do como eles enxergavam as causas que a fundação estava passando a olhar, nós também consultamos nosso público interno, não só da fundação, mas também de empresas do grupo e, principalmente, nós abrimos um canal direto com a sociedade, por meio de redes sociais, do nosso site.
Então quais são os temas mais relevantes para a sociedade civil em cada uma dessas causas? Por exemplo, em mobilidade urbana, educação para o trânsito e cidades inteligentes; em mobilidade social, empregabilidade e empreendedorismo em comunidades vulneráveis; e inclusão de pessoas com deficiência, educação inclusiva e inclusão dessas pessoas também no mercado de trabalho.
A partir daí a fundação, sem perder o seu norte, que sempre foi educação e já muito fiel a essas novas causas, ela pode, de fato, rever o seu portfólio e, principalmente, a gente agora tem no horizonte de três anos, que começou em 2019 até 2021, um caminho a trilhar. E hoje a gente sente no terceiro setor, principalmente nesse movimento de profissionalização não só das ONGs, mas também das fundações e institutos empresariais, outros parceiros vindo até nós para entender como a fundação chegou nessas causas.
O que é mais importante que essa matriz revela, é a importância da escuta e da escuta verdadeira, da escuta genuína e de transformar esses resultados em algo concreto que a gente devolve para a sociedade.
Marcelo Abud:
Bom, o Victor falou aí dessa caminhada toda e eu acredito que quem está agora acompanhando esse primeiro episódio, quer saber como é que na prática tudo isso é realizado. A gente tem como dimensionar um pouco a prática dessas ações? E a Fundação Grupo Volkswagen, ela conta com parceiros para isso, Daniela?
Daniela de Avilez Demôro:
Claro! Da mesma forma que nós trazemos o conhecimento e queremos dividi-lo e mover as pessoas através dele, nós precisamos de parceiros para concretizar toda essa estratégia que foi traçada. Não só parceiros privados, mas principalmente parceiros do setor público. Nós nos juntamos muito às Secretarias de Educação, sejam municipais, sejam estaduais, a institutos de acidentologia, a Detran, a protagonistas do poder público que possam impactar e que seja o veículo oficial esse sharing, né? Dessa divisão do conhecimento que a gente constrói.
Essas parcerias têm que ser duradouras, para realmente criar um movimento que seja eficaz e que possa trazer resultados verificáveis e concretos, elas não podem ser rasas, elas não podem ser de um ano apenas, por isso nossa matriz é de no mínimo três anos. Porque todos aqueles que conosco estão, buscam a mesma coisa, um resultado que seja mapeado, concreto e que gere uma base de dados para que seja cada vez mais aprimoradas essa tecnologia e essa metodologia que a gente investe.
Renata Pifer:
E esse relacionamento com os parceiros vem rendendo bons frutos, não é, Daniela? Nós acompanhamos nas redes sociais da fundação em fevereiro, a cobertura do evento e premiação da Zero Project Conference 2020. Conta para nós como é que foi essa experiência internacional da nossa fundação.
Daniela de Avilez Demôro:
Foi muita emoção. Foi o primeiro prêmio que a fundação é colocada numa esfera internacional de reconhecimento de uma prática inovadora para educação inclusiva de crianças com deficiência em escolas regulares, onde a metodologia criada com o parceiro privado conseguiu demonstrar que através desta reconexão da criança com o lúdico do brincar, se pode incluir sem qualquer barreira e sem qualquer julgamento da criança que possui deficiência daquela que não possui deficiência. São todas colocadas no mesmo nível.
O reconhecimento desse trabalho, genuinamente brasileiro, na sede da ONU, na Áustria, é claro que foi absolutamente primoroso. Agora mais importante do que esse reconhecimento, é ter tido a oportunidade de ver que no mundo inteiro tem muita gente fazendo muita coisa boa e é isso que também, eu acho, que a gente vai poder, daqui para frente, com esse podcast, trazer para os nossos ouvintes. Porque trabalhar no terceiro setor é muito difícil, assim como todos os setores é difícil, mas no terceiro setor, eu considero que todos aqueles que trabalham no terceiros setor são verdadeiros peregrinos, porque a gente tem que continuar muito motivado apesar de todas as dificuldades e quando você se conecta com uma rede de pessoas tão motivadas quando você, quando você olha esses projetos, e você vê a modificação verdadeira daquela criança, da família, da associação de bairro… e foi uma experiência sensacional. Não sei se o Vitor quer agregar alguma coisa, que lá ele esteve comigo.
Vitor Hugo Néia:
Eu queria agregar que a gente teve a oportunidade de apresentar o “Brincar” no painel que foi organizado na ONU sobre primeira infância, junto com experiências da África, da Ásia, da Índia, experiências aqui da própria América Latina. Além do Brasil a gente teve a República Dominicana também, e o principal, com esta conexão em rede, foi ver como o nosso projeto está alinhado com as melhores práticas em matéria de metodologia, de teoria, que estão sendo feitas no mundo.
Então você sair um pouco do nosso regional, do nosso nacional e olhar de fora e ver o que está sendo feito globalmente, reforça que a gente tá no caminho certo no caso do “Brincar”.
E nós também tivemos a grata surpresa durante o Zero Project desse ano, de um outro parceiro da fundação também ter sido reconhecido com um projeto que não é 100% financiado por nós, mas que também tem o apoio da fundação, que é o projeto “Diversa”.
Então a gente foi duplamente agraciado nesse caso, porque dois projetos da causa de inclusão de pessoas com deficiência, que é a causa mais nova da fundação, já chegaram a ser apresentando no fórum com organização das Nações Unidas. Isso nos enche de orgulho, de fato.
Marcelo Abud:
Bom, vocês falaram ainda a importância dessa rede de parceiros conectados com um mesmo propósito. E a gente aproveita para parabenizar, então, a Fundação Grupo Volkswagen por essa conquista e também a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, a Mais Diferenças, e ao Instituto Rodrigo Mendes pelo reconhecimento da excelência em seus projetos pela inclusão de pessoas com deficiência.
Aliás, vou deixar aqui um spoiler a você que nos ouve, esse será o tema de nosso próximo episódio. Não deixe de acompanhar.
Renata Pifer:
Fábio, como essa articulação que a fundação já faz entre investimento social, organizações da sociedade civil e poder público pode impactar nas políticas públicas do Brasil?
Fábio Ribas:
Esse é o ponto fundamental, né? Nosso tema aqui hoje é terceiro setor, mas o essencial a gente poderia dizer que é a articulação entre os setores. Para isso nós precisamos, do lado do Estado, de governantes que valorizem a participação democrática. Do lado das empresas, esta visão de que elas precisam ser socialmente responsáveis, como o Vitor definiu. E do lado do terceiro setor, a ideia de que é preciso cooperação para que as políticas mais importantes realmente se instituam, sejam sustentáveis. Tanto é que o terceiro setor também definido como aquelas organizações que às vezes conseguem chegar onde o Estado não conseguiu chegar direito. Você vai para um município, você vê que em certos locais, em certos territórios, em certas periferias, vocês às vezes tem uma escola, uma unidade básica de saúde e se você não tivesse ali uma, duas, três organizações que completam o trabalho, que encaminham pessoas para as unidades de saúde, que acompanham a vida das crianças na escola, tudo seria muito pior. Ou seja, um terceiro setor isolado. De um lado uma empresa isolada de outra e um Estado sem grande articulação com a sociedade, fazendo as coisas sozinho, não funciona.
Vitor Hugo Néia:
E só complementando e reforçando um ponto fundamental da fala do Fábio, as políticas públicas são responsabilidade do Estado, a partir do momento que a gente compra esse discurso que o terceiro setor tem que agir onde o Estado não age, a gente tá isentando o Estado de cumprir com seus deveres constitucionais. Então o terceiro setor é complementar, ele reforça, ele puxa políticas públicas que às vezes não são nem vistas, ele traz discussões, ele provoca esse movimento, mas ele não substitui o papel do Estado. Então isso é importante a gente sempre ter claro.
Daniela de Avilez Demôro:
Na minha visão, o terceiro setor tem o privilégio de não buscar o lucro e quando você não se preocupa em buscar o lucro, mas se preocupa em trazer qualidade verdadeira nesta articulação, nessa cooperação e na ajuda ao Estado de desenhar políticas públicas que sejam efetivas, com qualidade de informação, com qualidade de pessoas do conhecimento, profissionalizados, mundialmente falando, a gente consegue com que essa articulação seja de qualidade.
Marcelo Abud:
E pensando nessa articulação toda, a gente tem como estimar no Brasil quanto que em média é investido socialmente? Comparando com outros países, estamos bem nessa história, Fábio?
Fábio Ribas:
Esse tema hoje é um dos mais importantes no Brasil, que é de que recursos dispomos e o que estamos conseguindo fazer com eles. Se a gente pensar no orçamento público, existe um censo que é feito periodicamente pelo Gife, que é esse grupo que congrega institutos e fundações empresariais, que diz, por exemplo, que em 2016 foram investidos, aproximadamente, perto de três bilhões de reais no Brasil. Esse seria um número que indicaria tudo que todas as empresas, institutos, organizações do terceiro setor mobilizaram e investiram.
Agora veja, assim, a grande questão é saber que resultados têm sido alcançados. Eu diria que dinheiro, talvez, na melhor hipótese, é 49% da solução, os outros 51 dependem de articulação, composição, diagnóstico, boa informação que façam as políticas serem aprimorados, que elas cheguem aonde não estão chegando, que populações que não estão sendo alcançadas passem a vir ser alcançadas.
Daniela de Avilez Demôro:
É exatamente isso. Eu acho que uma outra área que acaba sendo muito esquecida por esse orçamento público e que as fundações acabam apoiando, é a área de pesquisa. Que é um privilégio também que a fundação pode se permitir, porque não busca o lucro, aportar em pesquisa. Para que esses dados sejam mais bem estudados, que a gente possa cooperar da melhor forma, com mais assertividade.
Fábio Ribas:
Queria reforçar a importância do que você coloca. A gente vive hoje no tempo das informações que ninguém sabe se são verdadeiras ou falsas e para que as ações sejam bem qualificadas, evidentemente, nós precisamos de boa qualidade de informação que pesquisas, diagnósticos, levantamentos, com o apoio de universidades, institutos de pesquisa… é da maior importância, isso é fundamental, né?
Vitor Hugo Néia:
E aproveitando a deixa do censo GIFE, eu queria trazer uma provocação, que desse recurso de 3 bilhões de reais que o censo de 2016 foi mapeado do investimento social no Brasil, a grande maioria vai para educação. Então a gente ainda tem um universo enorme de causas sociais para a gente trabalhar, de setores que não são cobertos pelo investimento social privado. Obviamente, a educação é sim o tema mais urgente pra gente abraçar, mas a gente precisa começar a olhar para a avaliação disso, né? Então o diagnóstico é importante e como avaliar o impacto esse investimento social. É um desafio para nós enquanto fundações empresariais, é um desafio de todo o terceiro setor, porque a gente começa a ver que na prática será que a gente está atingindo os resultados que esse recurso se propõe a atingir. Na ponta a gente vê que o retorno disso ainda é muito frágil e muito difícil de a gente mapear. Então como fazer isso? Acho que a avaliação é hoje o calcanhar de aquiles do terceiro setor.
Fábio Ribas:
Olha, complementando, você tem toda razão. Por que a antiga filantropia tentava fazer o bem, mas não olhava muito para se realmente mudanças estavam acontecendo e sendo sustentáveis. Então, acho que o Vitor coloca um ponto essencialmente, qualificar as organizações do terceiro setor para que planejem e monitorem os seus resultados e possam demonstrar, até porque, se demonstrarem resultados, também mobilizarão mais recursos para sua auto sustentação.
Marcelo Abud:
E, justamente, pensando nesse momento, Vitor, vocês apoiam empresas do Grupo Volkswagen em algumas ações de responsabilidade social. O que isso tem a ver com o compromisso delas com as comunidades?
Vitor Hugo Néia:
Então, atualmente, a Fundação Grupo Volkswagen tem seu órgãos de governança, que são três: o Conselho de Curadores, o Conselho Fiscal e a Diretoria Executiva. Três empresas Grupo Volkswagen, quando a gente pensa o grupo mundialmente, que são a Volkswagen do Brasil, Volkswagen caminhões e ônibus e a Volkswagen Financial Services. A gente teve o privilégio de conseguir congregá-las e foi importante conceitualizar a diferença entre investimento social privado e responsabilidade social corporativa, porque o que a fundação vai fazer, e o que a gente tem conseguido construir com essas empresas, é uma sinergia daquilo que elas já fazem e vão continuar fazendo com seus próprios recursos. E o que a fundação pode é apoiá-las e, eventualmente, também contribuir com o nosso recurso, que é um recurso de investimento social.
Então é importante sim ter esse olhar do gestor, do segundo setor, essas provocações, pensar sustentabilidade, pensar uma série de questões que são fundamentais para o futuro da fundação, mas ao mesmo tempo, nós, enquanto investidores sociais privados, também contribuirmos com provocações, com reflexões que apoiem essas empresas nas ações de responsabilidade social que elas já fazem. Então com isso a gente consegue uma relação de sinergia e, principalmente, para o futuro a gente constrói um caminho de fortalecer a sustentabilidade financeira da nossa empresa também.
Daniela de Avilez Demôro:
E esse caminho de sinergia faz com que projetos que se pautem nas três causas que temos, possam começar a conversar entre si e aí começa a ter um impacto positivo numa escala muito maior.
Marcelo Abud:
Bem, estamos nos aproximando da reta final desse primeiro episódio do “Vida em Movimento”, o podcast da Fundação Grupo Volkswagen. Eu quero agradecer as participações da Daniela e do Vitor, pela fundação, e do Fábio, da Prattein Consultoria. A palavra está com vocês, para uma mensagem final neste nosso primeiro episódio.
Daniela de Avilez Demôro:
A minha mensagem vai ser o início de uma nova etapa, a gente não termina aqui, a gente está começando e é o convite para que o ouvinte contribua com a gente. Os seres humanos estão no centro disso tudo, não nos esqueçamos que é dialogando, conversando, participando, se descolando do seu particular para pensar no público, que a gente se move melhor.
Então a minha mensagem é: venha participar conosco dessa nova jornada, desse movimento. Estamos esperando você.
Marcelo Abud:
Vitor?
Vitor Hugo Néia:
Além de agradecer pelo privilégio de estar aqui nessa primeira edição, eu gostaria de trazer de volta o propósito da Fundação Volkswagen, que é mover pessoas pelo conhecimento. Esse podcast é isso, é um mergulho no conhecimento, é a gente adentrar nas causas que a fundação apoia, é trazer especialistas, como o Fábio que está aqui conosco hoje, que tem conhecimento de causa, tem estrada para falar com o nosso ouvinte, com a nossa ouvinte, e é convidar para que vocês trilhem conosco esta jornada.
Então a fundação, com seus projetos, ela chega em determinado público, mas com esse podcast, a nossa intenção é que a gente expanda esse horizonte e que a gente, de fato, fortaleça o terceiro setor, que a gente traga reflexões para que o ouvinte quando termine de estar aqui conosco, ele leve isso para sua vida, ele movimente-se conosco, ele contribua para mudar a realidade do entorno que ele vive.
Marcelo Abud:
Fábio, por favor!
Fábio Ribas:
Eu me sinto muito satisfeito e feliz de ter participado aqui do podcast, no sentido de perceber que exemplo interessante esse da Fundação Grupo Volkswagen, que coloca em prática tudo aquilo que eu sempre imaginei e trabalhei para que acontecesse em termos de fortalecimento de terceiro setor, políticas públicas, institutos empresariais que têm a visão social. E eu encerraria dizendo que o terceiro setor, um professor já falecido, chamado Antônio Carlos Gomes da Costa, uma vez fez essa definição que eu vou relembrar aqui pra vocês: ele dizia que terceiro setor condensa o que há de melhor nos três setores, nos três mundos.
Do Estado ele puxa a valorização do bem comum, a responsabilidade pela gestão pública qualificada. Das empresas, o terceiro setor precisa puxar a capacidade de planejamento, a avaliação de resultados, gestão dos recursos necessários, para que os objetivos sejam alcançados. E ele, enquanto terceiro setor, traz aquela motivação para cidadania, a ideia de que eu não posso viver no mundo onde eu vou bem e do meu lado tem muita gente passando muito mal.
Marcelo Abud:
Muito bem, muito obrigado então pela participação de vocês. Queria passar a palavra à Renata, que vai agora deixar uma mensagem justamente nesse propósito de reflexão que a gente se propõe a trazer sempre aqui no podcast.
Renata Pifer:
O que é inovar? Impulsionar a inovação no terceiro setor é unir princípios, soluções tecnológicas e metodologias para enfrentar os desafios sociais. Mais do que isso, é valorizar as pessoas e o potencial de cada uma delas. Para a Fundação Grupo Volkswagen, inovar é inspirar movimentos que contribuam para a melhoria da sociedade e para o bem do mundo em que vivemos.
E você, como tem se movido para fazer do mundo um lugar melhor? Envie um e-mail para fundacaogrupoVW@volkswagen.com.br. Lembrando que fundação não tem ç ou til, tá? Ou uma mensagem de voz em nosso Facebook Messenger e compartilhe conosco os movimentos que você tem feito em sua vida e na vida da sua comunidade.
Marcelo Abud:
Muito bem. Estamos esperando a participação do ouvinte, aliás, é muito importante pra que realmente a gente consiga criar essa comunicação empática, que a gente consiga evoluir nas nossas discussões e acrescente a tudo o que nós vamos conversar nos episódios aqui.
Marcelo Abud:
Esse primeiro episódio do “Vida em Movimento” foi gravado no estúdio Play it Again Som & Imagem, São Paulo. O nosso técnico de som é o Caio Torrezan. A produção e roteiro são da Espiral Interativa e da Peças Raras Produções em Áudio.
E no próximo encontro, vamos conversar sobre inclusão da criança com deficiência na escola. Até a próxima!
Vinheta: “Vida em Movimento”, o podcast da Fundação Grupo Volkswagen.